MAGIA CHINESA E JAPONESA



“Esquecer os ancestrais é como ser um riacho sem nascente, uma árvore sem raiz.” Provérbio chinês



Diferentemente do Cristianismo histórico, o chinês não separou medicina, ciências e religião em universos distintos sem quaisquer pontos em comum. Toda a sua magia (bem como sua fitoterapia) nasce do equilíbrio de duas forças antagônicas, bipolares, que regem a Natureza, mas são complementares entre si. São elas: YIN – Força feminina, regente dos processos introspectivos, frios, da quietude, escuridão, a noite, a Lua, as doenças externas (pele, costas, etc.). YANG – Forca masculina, regente dos processos extrovertidos, a energia, a coragem, a luminosidade e o dia, o impulso, o calor, o Sol, as doenças internas. Essas duas polaridades (tão conhecidas dos africanos como as forças regidas pelos OMODE OKÙNRIN – masculinos e OMODE OBÌRIN – femininos, agrupados sob o nome geral de ÂWON IMOLÊ), juntas produzem o equilíbrio energético necessário para a manutenção da ordem no Universo e, conseqüentemente, em toda a Criação; não se esquecendo do existir dessas mesmas polaridades em nosso organismo promovendo, quando equilibradas, a nossa saúde física e mental.

A busca desse equilíbrio energético e o seu estudo na Umbanda que encontramos no nosso segundo trabalho onde procuramos abordar, com a maior clareza possível, a sua existência e seus resultados. Para o chinês, a união dessas duas polaridades criam entre si o QI (diz-se chi) que é a forca circulante em nossos corpos e em todo o Cosmos, força essa citada em outras culturas como prana, axé, bioenergia, fluido cósmico universal, magnetismo animal, Nun, base para toda a fenomenologia conhecida como parapsíquica, espírita ou mediúnica, intituladas na antigüidade sob o vago termo de “mágico”, apenas.

Atuar magicamente é, portanto, reequilibrar ou desequilibrar essas forças usando-as a favor do feiticeiro ou, como vê o chinês, para promover a cura do paciente em sua medicina. Não foi sem resistência que a medicina chinesa apresentou-se ao descrente mundo ocidental ganhando espaço em sua divulgação. Hoje é uma modalidade médica chamada por nós de Acupuntura (considerando-se que a medicina convencional já adote conhecimentos antes apenas ditos vagamente de “esotéricos” como as rotas de energia em nosso corpo, chacras e demais conceitos) e sua aparentemente muito estranha farmacologia estudada com afinco pelos mais modernos laboratórios que tentam decifrar-lhe através da análise de suas formulações, os milênios de eficaz experimentação. Quanto ao profissional, tornar-se médico na China desencorajaria muitos estudantes de Medicina no Ocidente pelas demasiadas exigências. A primeira preocupação seria se o paciente encontra-se com essas duas polaridades bem equilibradas. Examina-lhe atentamente os olhos, o pulso, os cabelos, unhas, até o odor exalado por sua pele. Observa aonde se manifesta a doença (se interna ou externamente). Por fim, prescreve-lhe remédios não convencionais como pó de pele de lagarto (para asma e impotência), pó de chifre de veado (fígado) e até fezes de esquilo (cólicas menstruais) escolhidos, colhidos e preparados sob os mais rigorosos cuidados. Esse aparente exotismo esconde um requinte próprio da medicina chinesa que, há 2100 anos já examinava o pulso dos doentes enquanto nós, na Idade Média, usávamos métodos ineficazes para não dizer absurdos como sanguessugas para todos os males, como infeliz exemplo. Podemos encontrar métodos de cura na Acupuntura, no Shiatsu e na Moxabustão, todas elas obedecendo aos princípios das polaridades. Para entendê-las, os especialistas chineses observaram haver pontos na pele de uma pessoa capazes de, quando estimulados, obterem resposta para varias doenças mesmo até aquelas consideradas de ordem psíquica em órgãos internos e externos. Compreenderam obter resposta nesses pontos correspondentes a certos nervos que levariam até ao ponto desejado suas descargas elétricas promovendo a cura – chamando-os mesmos de “rotas de energia” – passando aí a mapeá-los.

Começando por simples e primitivas agulhas, hoje a Acupuntura utiliza-se do laser, ventosas ou os tradicionais charutos de artemísia aplicados sobre uma rodela de gengibre, moxas (algodões acesos sobre a pele) sem, é óbvio, provocar ferimentos no paciente. Explicase o uso da artemísia como veículo, porque essa planta teria uma energia muito semelhante à humana e, portanto, compatível nesse tratamento. Mas quando a Acupuntura teria começado como modalidade médica? Arqueólogos encontraram lascas de rocha usadas na Idade da Pedra utilizadas com esse fim. Há relatos que, no século 4, o médico Bian Que tirou um príncipe do coma com essa metodologia. O uso de agulhas de metal só foi empregado a partir do século 8 e agulhas de ouro, no século 3. Essa técnica só chegou ao Brasil durante a II Guerra Mundial e hoje já está disponível na rede pública de saúde.

O perfeccionismo chinês também não poderia perdoar um médico desleixado ou de poucos conhecimentos; todo médico tinha a obrigação de ser, pelo menos, um bom profissional.

Naquela época tinha como função cuidar de um grupo de cidadãos: se alguém desse grupo morresse sob seu tratamento, colocavam uma lanterna vermelha na porta de seu consultório. Se houvesse muitas delas, ele haveria de ser desacreditado pelo resto da população.

No aspecto religioso, o Budismo encontrou solo fértil às suas idéias na China, implantando-se também em Sri Lanka, Myanmar (Birmânia), Tailândia, Japão, Coréia e Tibete.

Muitas de suas idéias também encontraram guarida na Umbanda como o respeito à Natureza, aos animais e à reencarnação, alicerçando-se em princípios similares presentes no Africanismo e Espiritismo. O Budismo, centralizado no luminar espírito de Buda - que em vida fora nobre príncipe hindu cuja sensibilidade o fez abandonar sua vida confortável e ociosa ao presenciar a miséria e a morte nas ruas de sua cidade-natal, tem como ponto mais alto a crença no mais profundo respeito a toda forma de vida, inclusive as mais desprezíveis em nosso ponto de vista, notando ser o homem apenas um dos itens da Natureza - fazendo parte e dependendo dela.

Firma-se essa idéia na crença de carma (somatório das boas e más ações de um indivíduo em várias vidas e suas conseqüências) registrado no arquivo akáshico do planeta e em samsara (ciclo de reencarnações) que todo o ser vivo precisa ter para poder evoluir. Nada, ninguém escapa de samsara a não ser aqueles que alcançaram sua libertação dessa roda de vidas sucessivas alcançando nível mais alto de pureza espiritual e desligamento total do plano físico, plasmando-se em uma energia única (o Budismo é panteísta). É o estado espiritual do nirvana, alcançado por Buda e muitos outros bodhisatvas que abençoam a Humanidade. Os budistas não crêem na presença de um Deus único, com personalidade própria como nós cremos. Acreditam numa energia única que dá alma aos seres e, após sua morte, voltariam a esse vasto caldeirão unindo-se a esse “todo”; por isso crêem que, em uma reencarnação posterior, a alma de um indivíduo poderá ser encontrada em várias pessoas, animais ou rochas complementando-se. Não concordamos nesse aspecto devido, através das incorporações mediúnicas, os espíritos ou guias falam-nos provando que mantêm sua individualidade após a morte e explicam-nos da impossibilidade dessa perda total de unidade. Porém, muitos dos aspectos preconizados pelo Budismo foram analisados com certeza por Kardec e outros estudiosos, fazendo parte hoje das bases de qualquer filosofia espiritualista cujas provas palpáveis encontramos na própria manifestação dos espíritos.

O Budismo não se manteve puro nesses países. Tomou emprestado de cada localidade seus deuses, seus mitos, lugares sagrados em um verdadeiro sincretismo religioso. Essa preocupação, porém, de escapar-se de samsara com boas atitudes plasmou o tradicional perfil do povo japonês e chinês de natural delicadeza. Permaneceram tendo suas montanhas sagradas, seus deuses das águas, sua figueira-dos-pagodes sagrada dedicada a Buda, seus métodos de adivinhação tão semelhantes ao Jogo de Ifá iorubá, suas temíveis feiticeiras, seus festivais.

Vale-nos comentar que encontraram, remontando a 2000 anos antes de Cristo, quase cem mil pedaços de ossos carbonizados e conchas usados para adivinhação. Os sacerdotes escreviam suas perguntas no osso, queimavam-no e observavam suas rachaduras, anotando as respostas no mesmo. Esse era um dos métodos de adivinhar-se o futuro. Outro era o I-Ching, popularizado e simplificado no Ocidente, cuja origem é incerta. Alguns datam-lhe a criação atribuída a dois imperadores de nomes Wen Wang e Chou Kung na exagerada data de 12.000 AC. O mais notável nesse jogo, e muito pouco comentado, é que sua filosofia interna gira em torno das duas polaridades Yin/Yang que mudam o tempo inteiro, deixando ao homem a tarefa de descobrir-lhes as mudanças e, como primeiro objetivo, aprender a agir no momento certo. São o estudo dessas mudanças e a resposta de como atuar é que mostra o IChing chamado, por isso, de “O Livro das Mutações”. O jogo deixa bem claro que o destino não é fatalista como querem muitos filósofos ocidentais, mas é possível mudálo e vivenciá-lo bem. O panteísmo budista não encontrou respaldo na realidade vivenciada pelas populações dos países aonde se implantou. A descrença em um Deus único e a falta de comunicação entre vivos e mortos (ancestrais falecidos) tornou o Budismo “puro” uma filosofia bastante sedutora, mas inaceitável. O povo permaneceu inquirindo aos deuses o que fazer em seus templos. Permanece dirigindo-se ao astrólogo, ao quiromante, ao fisiomante, retornam aos seus lares, invocam e consultam seus ancestrais mortos. Diferentes escolas filosóficas dentro dessa doutrina desenvolveram-se a partir daí. O mesmo fazemos nós ao procurar os jogos esotéricos na Umbanda e a resposta de nossas dificuldades em nossos ancestrais na consulta com os Caboclos, Pretos-Velhos e, quem sabe, incluímos aqui nossos Exus. Como pensariam algumas das escolas reencarnacionistas ocidentais, nem mesmo os deuses escapam de samsara. Apesar de seus imensos poderes, ainda não são perfeitos e precisam reencarnar para evoluir como qualquer criatura. Um budista não pode crer em seres criados perfeitos desde seu nascimento, como crê o cristão vinculado às Igrejas na figura dos anjos e toda a sua hierarquia celeste, nem em pobres coitados condenados ao fogo eterno dos precipícios infernais. Uma lei divina tão imperfeita que privilegia alguns e condena pela eternidade outros não encontra guarida no pensamento de eqüidade que tem o oriental. Observando as mutações permanentes do mundo material e sua falta de perpetuidade, Buda afirmou ser o mundo físico, palpável, uma mera ilusão, um momento fugidio que poderá ser destruído ou alterado em um segundo. Até mesmo o grande avatar Krishna soma-se nessa observação, alertando-nos da necessidade premente de desapegar-nos da matéria para nossa sabedoria não ficar escrava dos modismos, da tolice de crer-se eterno e belo dentro de um tempo que não pára, de acreditar-se maior ou mais sábio do que outros pois a sabedoria de uma época nem sempre será a de outra. Para os povos do Oriente, opostos em completo da nossa maneira de pensar, o material é que é ilusório; o espiritual é que é palpável, perene, imutável.

Tentou-se, em vão, alterar o pensamento do povo chinês com as doutrinas econômicas e sociais que tentaram endeusar a figura do governante em detrimento da prática da fé que foi proibida em muitos lugares. Felizmente, nas províncias mais distantes preservou-se a magia e a figura de velhas feiticeiras sendo talvez a mais famosa, a pequena província de Yunnam, a sudoeste da China. Lá pequenas etnias (miao, bai, dong e yi) ficaram esquecidas, espremidas pelas cordilheiras tibetanas, na mais comovente pobreza. Tais etnias, como forma de resistência, produziram mulheres capazes de preservar o conhecimento ancestral passado de avó para neta cuja especialização consiste na feitura de pós mágicos conhecidos pelo singelo nome de gu. Esses pós mágicos, idênticos aos usados no Vodu haitiano, têm por propósito a criação de zumbis. Vale uma interrupção nossa quando tentamos, em todo esse trabalho, mostrar que magia, reencarnação, comunicação entre vivos e mortos e toda a base espiritualista é idêntica, absolutamente idêntica em todo o mundo e em todos os tempos. Quando fazemos Umbanda resgatamos uma sabedoria ancestral, cuidadosamente preservada pelos antigos que tudo fizeram para que ela chegasse até nós incólume, dentro de suas reais possibilidades. Atente o leitor a esses detalhes pois nossa Umbanda é um museu vivo de preciosos conceitos. Umbanda é, como poderemos comparar, magia pura universalista. Não precisaremos dizer que essas feiticeiras eram requisitadas por governantes e etnias com fins de destruir inimigos; até mesmo prostitutas procuravam seus serviços com o intuito de escravizar clientes ricos. O gu, feito para criação de zumbis, era fabricado à base de datura (estramônio), conhecido no Haiti como “pepino-do-diabo” e um dos elementos do famoso pó que também cria zumbis nessa tão distante ilha. Essa planta de propriedades alucinógenas era pulverizada misturando-se a outras plantas, insetos, pedras em pó e lançado aos chás oferecidos às vítimas escolhidas que sempre era um homem, conforme a tradição, punido por infidelidades à esposa, ou para conquistar amantes desejados, quem sabe noivos interessantes. Datam relatos do uso desse pó durante a dinastia Ming pelos idos do século 14. A datura produz, graças à atropina, um relaxamento muscular profundo, visões pavorosas, desorientação motora, amnésia, estupor, até mesmo o coma irreversível. Já era usada na Índia pelas mulheres que queriam deitar-se com europeus, entorpecendo seus maridos e, ritualisticamente, no preparo de vítimas humanas à deusa Kali. Fala-se que as feiticeiras européias já usavam a planta, entorpecendo-se com ela ou passando-a em cabos de vassoura, sem maiores detalhes, nos rituais sabáticos. A famosa imagem da feiticeira montada numa vassoura, em histeria, remontaria a esse uso. O que é hoje modismo entre nós, os chineses já conhecem há muito tempo na arte de Feng Shui, dedicada à feitura, decoração de casas e prédios integrando-as à Natureza, no respeito ao equilíbrio das polaridades proporcionando bem-estar aos seus moradores. Para tanto, aprofundaram-se no estudo das cores e formas geométricas de maneira notável em seu uso mais profundo, do que meramente decorativo.

Enquanto para eles já era uma arte antiga e uma ciência, apenas agora estamos engatinhando nas qualidades da Cromoterapia. Na Umbanda, dentre todas as religiões espiritualistas, o uso de certos materiais e cores fazem parte da essência de seu atuar no plano físico e astralino. Muitas religiões, até mesmo aquelas dedicadas à espiritualidade, estranham as cores de nossos uniformes, guias, escolha de tintas nas paredes de nossos templos, cor de sintonia de uma falange pronunciando discursos desairosos com fins de desmoralizar nossos cultos. Lamentável tal atitude já que, acreditamos, não falte discernimento sobre o que expusemos aqui. Retornando à religiosidade chinesa, nenhum território se equipara ao Tibete, certamente. É o grande pólo místico do Oriente com um Budismo muito particular chamado de Lamaísmo ou Budismo Tibetano, mistura da doutrina original com a antiga religião daquele povo.

Estatisticamente, um terço da população masculina prepara-se para a vida monástica e relata-se que um simples festival, na década de sessenta, era capaz de reunir a soma de quinze mil monges participantes. Tanta fé foi alvo da ferocidade marxista que anexou o Tibete à China em 1951, cujo saldo de mortos na revolta de 1959 foi de um milhão de indivíduos com a maior parte dos seus mosteiros destruídos; impossível foi, no entanto, diminuir-lhe a crença na liderança de Dalai-Lama (reencarnação do deus Avalokitesvara, senhor da bondade e da misericórdia) que, nesse período, teve de abandonar seu amado país.

Para eles, o Tibete é o centro do planeta, surgido a partir o erguimento do Monte Meru, o “umbigo do mundo” (recordamos aqui as temáticas egípcia e iorubá nesse detalhe – explicação mítica do processo de aglutinação da matéria no montículo sagrado) e com a sacralização do Monte Kailas de 500m de altitude, cuja caminhada de 50km em torno dele permite o salto de uma reencarnação à frente. O Budismo Tibetano não traz traços de originalidade, trazendo sua proveniência de Bengala, pátria de todo o ocultismo indiano. A partir de agora iremos nos ater ao que os monges chamam de tulpas, poderosas criações de formas-pensamento, uma das bases principais para que se possa compreender qualquer processo mágico desenvolvido no mundo. É mister que se saiba que para os monges tibetanos o pensamento não é inerte, subjetivo, como tanto cremos em nossa cultura. Dedicam eles toda uma vida à meditação, peregrinações religiosas, culto extremo ao bem, busca de iluminação espiritual e jejum para, com isso, transformá-lo em matéria-prima para moldar o que desejarem ou até criando chaves para projeções de seus corpos astrais a mundos superiores. Na criação de tulpas não é necessário repetir-se que tal ato exige preparos e resguardos extremos. O monge, para tanto, retira-se a um local tranqüilo, passando a invocar sua divindade tutelar (guia, anjo-da-guarda, Orixá, como queiramos) entoando seus mantras específicos, desenhando diagramas simbólicos (não pudemos deixar de lembrar nossos pontos riscados com pemba) com tinta colorida em papel, madeira, metais ou na terra. Se fizer mal o desenho (cuja forma será sagrada apenas a ele, não tendo uma forma padrão) estará sujeito à punições que poderão ser a loucura, morte, obsessão, ser preso nas regiões umbralinas tibetanas. Mas se tudo der certo, seu Yidam (guia) será plasmado pela sua mente na forma imaginada e irá segui-lo. Às vezes poderá ser visto por terceiros ou, na pior das hipóteses alimentada pelo subconsciente de seu criador, a forma-pensamento poderá tornar-se perigosa, impertinente e muito difícil de ser destruída. Consideram muitos dos lugares assombrados (“pesados” espiritualmente) povoados de aparições fantasmagóricas, locais povoados de tulpas que sobreviveram à morte dos seus criadores em circunstâncias de sofrimentos extremos, da mesma forma plasmados a partir de uma obsessão cruel ficando “gravados” nos lugares de dor. Por exemplo, imaginemos uma masmorra aonde muitos passaram por torturas indescritíveis, ficando impregnada de tulpas criadas a partir da força do pensamento desesperado dessas vítimas, inundando paredes, instrumentos e tudo que ali estiver. Um médium, na qualidade de psicometria, poderia perceber essas tulpas ali gravadas captando-lhes a forma, revendo a dor dos torturados, cenas como de um filme passando pela sua tela mental. Muitas polícias internacionais, como a inglesa, já utilizam-se desses médiuns na solução de crimes há muito tempo, inspirando filmes e seriados que, para o leigo, não passaria de simples ficção. Ainda, os monges tibetanos crêem que muitos videntes presenciam essas tulpas apavorando-se ou, na pior das hipóteses, causando depressão nos moradores dessas residências povoadas delas, obrigando-os a abandoná-las. Seria essa a origem dos castelos ditos “mal-assombrados” tão comuns na Europa ou dos objetos e gemas “malditas” aos seus azarados novos proprietários.

Abordado ligeiramente antes, seria imperdoável não comentar com maiores cuidados a crença budista de que uma alma poderia vir a reencarnar em mais de uma pessoa. Às vezes muitas delas. Alguns teriam uma reencarnação especial chamada de tulku, traduzindo-se como aquela pertencente a uma linhagem preservada pelos séculos afora, durante várias vidas. Exemplo de um tulku é a do jovem brasileiro Michel Calmanowitz, rapaz de origem judia, cuja reencarnação (após rigorosos testes comprobatórios) seria de Gelong Wangyal-la que, por sua vez, anteriormente, foi um grande filósofo e escritor sacro. Agora Michel é um lama, um maha siddha (homem santo) vivendo nos monastérios tibetanos recordando o que aprendera, o que ensinara a tanto tempo passado. Suas obrigações religiosas resumem-se a quatro mandamentos que são: não matar, não roubar, não mentir, ser casto. Michel, quando descoberto pelos sacerdotes tinha apenas 5 anos, agora tendo 17 anos. Eis uma grande curiosidade: como são feitos esses testes e como descobrem em qualquer lugar do mundo essas reencarnações? O Budismo quando chegou ao Japão deparou-se com uma religião muito mais antiga voltada a um caráter agrícola, povoada com a presença de vários deuses relacionados à Natureza vigorando nesse país. Essa religião mais antiga continuou a ser preservada sob a denominação de Xintoísmo para diferenciá-la do tradicional Budismo que nascia ali, hoje contando com três quartos da população entre seus crentes. Nela pulula deuses e almas de ancestrais mortos que recebem grande deferência dos vivos, honrados com diversos cuidados tais como, por exemplo, a crença de que ficariam perturbados logo após a morte, sendo necessário vários rituais para desligar-se do plano físico. Tornam-se um guardião daquela família, uma deidade, lembrados nos custosos festivais xintoístas quando são invocados em pontos sagrados (xintais) que poderão ser uma árvore, uma rocha, montanha, espelho, espada, jóias dentre muitas outras coisas. É perturbador, para nós umbandistas, a similaridade desses princípios com tudo aquilo que sabemos e até com as idéias africanas de vida após a morte, sem dúvida alguma. Todos dizem a mesma coisa, com alguns detalhes diferentes, desde que o mundo é mundo e em todas as localidades. Tais evidências não comprovam apenas origens comuns, dadas a alguns povos: um conceito, se falso fosse, não se preservaria pelos milênios da mesma maneira dito por gente tão diferente. Mesmo que as mais determinadas correntes de pensamento ocidentais e suas igrejas queiram tolher tais verdades incontestáveis, ela ressurge com mais força em todas as nações alicerçada pela própria realidade que vivenciamos no dia-a-dia com o mediunismo consciente ou inconsciente que todos possuímos, mas que alguns crêem ser apenas “intuição”, “quem sabe, talvez”, déja vu, “será que foi minha imaginação”. A comunicação entre vivos e mortos, a imortalidade e sobrevivência da alma após a morte, a reencarnação para nós e todo o grande resto da Humanidade, é corriqueiro, palpável, transparente. É natural que a realidade xintoísta de intercâmbio entre vivos e mortos acabou tendo prioridade no pensamento japonês que encontrou, num Budismo panteísta distanciado, muito filosófico, pontos de divergência. O Budismo japonês, conseqüentemente, adquiriu a fisionomia toda particular que ele possui. No século 7, cada clã no Japão honrava uma divindade tutelar que protegeria aquele grupo de parentes. Quando a família imperial japonesa subiu ao poder implantou sua deusa como divindade nacional, Amaterasu Omikami, deusa solar, cujo panteão variado passou a governar tendo na figura do próprio imperador seu sumo-sacerdote, no culto xintoísta. Há no Xintoísmo oferendas de saquê (bebida alcoólica feita à base de arroz), comidas aos deuses locais, purificação dos crentes através de banhos (misogi) ou o agito de um ramo sagrado (sakaki) sobre o fiel pelo sacerdote. Purificarse, para o japonês, é entrar em contato com os deuses permitindo sua interferência sobre si. Médiuns, xamãs sempre são consultados com práticas muito conhecidas àquelas tão sacramentadas por nossa Umbanda como o uso do sal para afastar espíritos perturbadores nas casas, ao menos uma vez ao mês; divisão de alimentos santificados em festas; ter-se templos, mas com preferência ao culto ao arlivre; veneração aos ancestrais (para nós, nossos índios, Pretos-Velhos, Crianças, Exus), reverência à Natureza e igualdade entre todos. Tardiamente, o imperador foi relegado à deificação pessoal e passou a governar um Xintoísmo estatal que serviu-lhe para a implantação de um estado teocrático.